domingo, 30 de dezembro de 2012

Feliz ano novo!

Eu poderia fazer o último post do ano com a poesia do Drummond que está na (ótima) propaganda do Bradesco. "Receita de Ano Novo" cabe em qualquer fim de ano possível. Pois é "dentro de você que o ano novo cochila e espera desde sempre". Festas à parte, trago um poema reflexivo. A poesia em si é um grande instrumento de reflexão e resolvi usá-lo nos seguintes versos.


 Ilha

Sou uma ilha.
Ser um pedaço de terra envolto de água
não me incomoda.

Não me convém ser um continente.
A vastidão e a grandeza não me pertencem,
e a uniformidade me perturba.
Aliás, a Pangéia era nada mais
que uma ilha de ego inflado.

Sou ilha, não importa qual.
Se Florianópolis, Marajó ou Galápago,
sou um só, sem igual,
mesmo sendo de um arquipélago.

sábado, 22 de dezembro de 2012

A tecnologia e a poesia

   É inegável como a tecnologia tem evoluído nas últimas décadas. Com o advento da internet e com a evolução dos meios de comunicação, o consumidor teve mais acesso ainda a essa tecnologia. (Praticamente) todos hoje tem um notebook, um tablet ou um smartphone (ou os três!). Invariavalmente todos os setores da economia e da vida - dos operadores das bolsas de valores à religião - precisaram se ajustar e incorporar a si a revolução tecnocientífica.
   Com a literatura não é diferente. Praticamente todos os escritores hoje usam tablets ou computadores para trabalhar, ao passo que muitos leitores abandonaram o papel e leem em suas telas. Mas e a poesia? 
Posso dizer que a poesia ainda não está incorporada ao processo. A composição do poema é diferenciada. No papel as idéias fluem mais facilmente. Agem como uma psicografia. Na digitação, não. É como se uma tese, um trabalho, estivesse sendo redigido. "Não existe mais poesia, e sim artes poéticas" - com diria Manuel Bandeira - se todos os poetas resolvessem aposentar a celulose. 



  A poesia do meu tempo

Há quem escreva poemas agora
em computadores e em telas de retina.
Nada contra. Nada principalmente a favor.
Os aplicativos exigem a perfeição e a forma.
O papel, apenas a licença poética.

Licença consentida.
O papel pede a caneta ou o lápis,
ou a pena, para o nostálgico.
A máquina te impõe pontuação e acentuação.
O papel te oferece a imperfeição.

Imaginem que chata a manchete:
"Encontrado backup de Camões".
Mas sempre é fantástico
o rascunho do letrista não sei onde achado.
Mofado, sujo e amarelado.

É comparar o gol de canela com o de bicicleta,
a comida da avó com a de conserva,
Garota de Ipanema num riff de guitarra,
com o dedilhado do Poetinha.
Assim também as poesias de pixels e de celulose:
são a mesma coisa;
a coisa é que não é a mesma.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

A arte hoje: somos vítimas ou culpados?

    Estou há muito tempo sem escrever. Decidi voltar à atividade hoje. É um pouco sobre a nossa carência cultural. É mais fácil um artista rimar o nome de um carro e usar os clichês amor-dor, paixão-coração e etc. que realmente procurar inserir algum conteúdo no seu trabalho. O quadro se estende para a literatura. Os títulos em destaque apelam para sexy simbols (ora com gravata prateada, ora como ser hematófago) para atrais, em geral, leitoras carentes. Aposto que grande fatia comprou Crepúsculo por causa do ator, mas duvido que compraram "Iracema" pela beleza da protagonista ou "O Guarani" pelos músculos de Peri.
   Isso não é exclusividade tupiniquim. Os artistas que nos empurram goela abaixo vindo do "estrangeiro" preferem fazer clipes sensuais, letras apelativas e pronto. Não critico o público, pois se grandes artistas voltassem a ser prioridade para as gravadoras, editoras e para a mídia como um todo, o panorama estaria diferente.


Prisma

A poesia é o inverso de um prisma.
Junta as sete cores e forma uma luz.
Indissociável.

Se a luz se refrata em sete tons,
há sete sentidos. Sete sensações.
Se um verso é esquartejado em palavras,
não há nada a mais que caracteres enfileirados e vazios.
Apenas o reverso: as letras se juntam para fazer a razão.

Na aquarela, o azul até rima com o anil
e o laranja com o vermelho e o amarelo.
Mas pobre do verso que se contenta
em não ter razão para ter paralelo.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Poema médico mais uma vez...

Anatomia de um poema


Posição anatômica: olhar no horizonte.
Então vou dissecando o poema.
Conto as sílabas poéticas como quem conta vértebras, 
processos espinhosos - como sabe ferir um espinho rimado! - 
e processos trans-versos. 


 Na Neuro começa o problema.
Há versos que me neuram, me marcam
e, nos feixes do sistema límbico,
o poema vai se enrolando de libido. 
Envolvente como a mielina em seu tecido. 


Vou examinando cada órgão
 e dividindo em estrofes e estratos. 
às vezes enxergo até uma imagem esquisita:
aqui ou ali um parasita. 


 Terminando o estudo. Está pronto: 
Tudo anotado. Logo será publicado. 
O corpo incidido e o poema estão abertos. 
Hora de dar os pontos...

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Amor divino e Paixão humana


O futebol mexe com os brios de pelo menos 80% da população mundial. É um sentimento incontrolável e inexplicável. Nem sempre é sinônimo de patriotismo, pois para a esmagadora maioria, o seu clube é mais importante que a seleção do seu país, e estou inserido na estatística. Nenhuma forma de amor é tão voraz, insaciável e explosiva nesse mundo terreno que aquela que um torcedor carrega no peito.
É divina, pois sabe perdoar e não guarda mágoa. Seu time pode ter perdido, sido humilhado e você pode até ir dormir de cabeça quente (ou não conseguir dormir) e dizer “eu nunca mais quero saber de futebol!”. Porém, no dia seguinte já acorda fazendo contas para a tabela de classificação. É, meu caro, você já perdoou. Não há como guardar rancor de algo tão nobre que nos alegra e nos desespera no mesmo minuto. É amor divino pois não há preconceito nem ciúme. Afinal, se você torce por um time, você não se importa que outras pessoas também torçam. Não é como uma mulher, que você odiaria que outra pessoa a amasse. Quem frequenta estádio sabe: na hora do gol, todo mundo é irmão. Já abracei tanta gente fedorenta que na hora parecia abraçar um anjo. Não tem divisão. Qualquer um pode amar seu time. O favelado, o miserável, a classe média e o milionário. É um amor bíblico que sabe esperar quarenta anos vagando pelo deserto em busca da terra prometida (ou um título), que é incondicional e milagroso. É um amor que leva do inferno ao céu e vice-versa.
E a fidelidade é crucial para a divindade do negócio. Conhece alguém que tenha trocado de time? Dificilmente. É um amor que você escolhe ao nascer. Na verdade, não se escolhe. É como se cada um fosse selecionado para perecer diante de um time sua vida toda. Claro, tem aqueles que trocam de time por causa de namorado, da sogra ou pelo dinheiro ou qualquer outra coisa. Francamente, quem trai um amor tão sincero desse não deve ter amor próprio, e um traidor assim não é perdoado. Um exemplo são os jogadores. O atleta troca seu time por um rival. Pode ser que seja um salário melhor ou coisa e tal e os sabichões intelectuais irão falar “ah, ele é um profissional”. Sim, ele é um profissional. Porém, você leva uma bandeira com o rosto do padeiro quando vai comprar pão? Os pacientes cantam em coro o nome da clínica e do médico enquanto sentam na sala de espera? Você compra uma camisa com o nome do seu advogado nas costas? Provavelmente não. Portanto, não é uma simples troca de uma empresa por outra, mas sim uma apunhalada no peito fiel de um torcedor apaixonado. E por ser um amor divino, pecados capitais não devem ser perdoados…
Todavia, por ser uma paixão, é propriedade humana, e aí que a coisa fica mais intrigante. O ser humano apaixonado é capaz de tudo, e nem sempre isso é um aspecto positivo. O apaixonado briga, sai no tapa, na faca, na bala, e isso é o que vem acontecendo nos estádios e arredores. Amantes organizados brigando para saber quem é o melhor, sendo que isso se resolve no campo, não fora dele. Não só a questão das brigas e da violência, mas o sofrimento aqui fala mais alto. Quando o time perde, o torcedor não quer almoçar, não quer sair, não quer atender o telefone. A derrota é a TPM masculina. É uma prova de sensibilidade de uma mulher não mexer com um macho derrotado, pois este sofre. É uma automutilação, pois mesmo com a certeza da derrota, não sai do estádio e nem da frente da TV, sofrendo a cada instante e depois dele. Sofre como quem dá-se ao carrasco. Uma dor lancinante, um remorso, uma angústia, um arrependimento (ainda que não foi você quem levou o frango ou perdeu o pênalti), o mais amargo e depressivo dos sentimentos. Não demora muito, semana que vem pode ser resolvido com um gol. E é assim que nos vingamos de todas as derrotas da vida: a cada gol do meu time eu me sinto um vencedor.
De tão humano, usou os defeitos para criar qualidades. A rivalidade – que mata e espanca – é a mesma que faz a brincadeira bem humorada, a gozação de toda segunda e quinta feira, as gracinhas nas redes sociais e etc. Quantas amizades não foram construídas graças à rivalidade? Alguns dos meus grandes amigos conquistei discutindo futebol e falando mal dos seus times, enquanto defendia o meu com unhas e dentes. É divertido, e mesmo que seu time seja superior ao do amigo, a discussão nunca tem um vencedor.
O grande mal da humanidade é a inveja. No caso da paixão futebolística não é diferente. Quem não tem um amor desses (ou torce pra Portuguesa, CSA, Tuna ou sei lá) fica falando mal de quem ama. Ora essa, onde já se viu criticar um homem por amar?! E não adianta falar “ele não gosta de futebol, ele é gay!”. Isso é mentira, pois conheço muitos torcedores do Grêmio, Fluminense e São Paulo e eles adoram futebol. É coisa de pseudo-intelectual. É como falar que não gosta de escola de samba ou da globo. Soa bonito para um ego inflado. Pensa que é um Aristóteles do século XXI. Talvez se deixassem o sentimento fluir logo perceberiam o carrossel que iria tornar suas vidas e assim deixando o nobre coração torcedor em paz. Quem ama aceita as consequências de sofrer e gosta disso.
Por base em todo esse longuíssimo e extenuante texto, trago minha tese: o futebol tem asas de anjo em carne humana. É uma força maior que nos guia, que nos faz comemorar efusivamente cada gol pró e cometer um autoexílio na solidão de cada gol sofrido. Se dizem que o melhor amigo do homem é o cachorro, a melhor amiga com certeza é a bola.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Pré-feriado

Tudo pronto para o feriado? Vamos por os assuntos da faculdade/colégio/cursinho em dia ou acordar tarde todo dia e se empaturrar de chocolate?
Tanto faz, o que importa é que é feriado!

Trouxe para vocês, queridos leitores, um poema novo.


Literatura

Quando resolvi pensar em ti
Votei em um mundo de poesia.
Mas sem palavras, sem refrão,
sem caderno, sem rimas.

Tentei fugir, esquivei-me do teu olhar.
Até que dedilhei sonetos nos teus cabelos
e jogaste, num suspiro,
redondilhas pelo ar.

O que ganhei foi o inverso:
uma poética caleidoscópica.
Tornaste em ti toda a Literatura
no teu corpo frente e verso.




terça-feira, 27 de março de 2012

Advinha quem está de volta na praça!

Após um abandono ao fazer poético, cá estou de volta para postar no blog. Minha vida tem sido muito intensa e acabo preterindo a poesia. Infelizmente. Poesia deve sempre ser prioridade pra quem deseja ter uma vida sorridente e feliz. Por isso, tentarei a partir de hoje trazer outros assuntos pro blog, sempre tentando enxergar a poesia - cada qual a seu modo - em tais temas.
Fiquei muito feliz por algumas pessoas terem de fato sentindo a falta do blog. Algumas pessoas me questionavam - ao vivo e via redes sociais - sobre a inatividade do Leia no Verso. Em especial o Augusto Serique que compartilhou o link no facebook e ao Boamorte do Hospital Municipal, que sempre quando me encontra por lá está me cobrando!
Também fiquei feliz ao ver as estatísticas. Mesmo com o blog parado, tenho recebido em média 450 visitas mensais e para minha surpresa 62% do público sendo estrangeiro. Segundo o portal URLPULSO o blog - ainda que inativo - esteve na posição de 953.079 site mais acessado no país. Isso é muito!
Então vamos ao que interessa.




Torpor


Encheu-se de si como faz todo ano.
Chegou pela frente
e escancarou a porta sem pudor.
Derramou-se caído no chão.

Lambuzou toda a sala e o hall de entrada.
Espalhou toda a sujeira na sua megalomania embriagada.
E ali ficou jogado, seu suor musculoso e dos ratos;
seu peso espalhado por chão e buracos.

E cobre-se com seu manto azul royal.
Passam os dias e meses
até sua mulher vir lhe buscar.
Eis que brada - pálida e amarelada - a brava Amazona do lar:
-Vamos, Tapajós!